06 agosto, 2008

a companhia do vácuo e pernas dormentes

Estava sentada na bancada de um bar moderninho quando a encontrei. Era raro encontrar qualquer um, mas às vezes acontecia. Ela me reconheceu rapidamente, eu demorei um pouco.

Debaixo de todas aquelas tatuagens e cores diferentes no cabelo, não se parecia em nada com a garota gordinha e de óculos da escola.

- é você?

Agarrada num copo sentou-se do meu lado.

- espero que seja.
- nossa, é você mesmo.

E arreganhou um sorriso naquele rosto com pele de pêssego e cabelos macios. Levantei as sobrancelhas e reafirmei minha identidade.

- nossa, o que você anda fazendo?
- bem, nada muito importante.
- ah, como assim ?
- e você?
- sou escritora e cantora, não me reconheceu?

Não, mas sorri como se não tivesse entendido bem a pergunta.

- estava em Londres terminando meu doutorado.
- legal.

Silêncio. O passado nos atinge das formas mais desagradáveis. E ela disse:

- sempre adorei o que você escrevia na escola, me influenciou muito, por que não continuou escrevendo?

Sorri o sorriso mais largo que pude, peguei minha cerveja e me levantei vagarosamente. Ela me seguiu com os olhos e entendeu. Sentei-me no final do balcão, em um lugar escuro e quieto, bem próximo a saída. Assim era seguro, mais uma tentativa de resgatar o passado e eu estaria fora dali em segundos.

Ela se levantou e foi se encontrar com os amigos na mesa. Era muito digna. Ficaram até às 4 da manhã bebendo whisky e outros drinks caros. Cantaram canções e sairam abraçados. Eu permaneci no canto escuro fazendo companhia ao vácuo até que senti minhas pernas dormentes. Cambaleei para fora do bar e andei muito digna até a minha casa.